sexta-feira, 31 de maio de 2013

O artista




Ele foi o artista mais talentoso que conheci, durante anos, interpretou constantemente e incansavelmente um único papel, dedicou a sua vida a seu personagem. Usou de todos os truques que os maiores artistas já inventaram. Ele se embriagou, fantasiou e dissimulou. Quando estava triste, não se permitia chorar, empunhava a sua mascara e a colocava em seu rosto, em seu corpo e ate mesmo em seu coração, E assim alegrava todos a sua volta, a platéia jurava , que a felicidade repousava em sua alma, mas o que eles sabiam do grande artista? Quando lhe perguntavam como estava à vida, ele sentia vontade de desabar, de dormir e não mais acordar, e então ele mentia, contava historias de como sua vida era boa e que seria impossível ter uma vida melhor. E ele atuou, atuou e atuou... Tanto, que não sabia mais viver sem aquele personagem. Ah! Mas a que custo ele mantinha aquilo, o preço era tão alto... Como ele não queria ser nada daquilo, como ele queria ser como os outros e chorar quando estivesse triste, reclamar da vida que não era boa, cometer os mesmos erros bobos que todos cometem dia após dia, ele só queria ser normal, Mas ele não podia... Todos o conheciam por aquele personagem, e ele como um bom artista não podia decepcionar seu público. Mas ele tinha medo... Medo de descobrirem sua atuação, medo do que o seu público falaria dele, e então quando achou que não mais suportaria , voltou os olhos para dentro de si e perguntou: quem é esse que furto o rosto todo dia e ponho sobre o meu? E ele gritou bem alto para cada abismo e montanha da sua alma ouvir: Quem é este ser que vive em mim e não sou eu? E de repente, ele se deu conta de que era um artista, e que interpretava a peça da sua vida num teatro sem cor, para uma platéia de cegos que não podiam notar a diferença do amor e da dor. E então o grande artista refletiu: de que me vale a opinião de uma platéia senil sobre a efêmera peça da minha vida?

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Hóspede indesejado

A tristeza bateu na porta do meu coração, abri e deixei-a entrar, e logo ela se instalou, mas como poderia negar? O amor que antes vivia, há muito tempo se foi, viajou sem destino certo e nunca mais voltou. Agora que a tristeza reside em minha morada, como abrir mão da única coisa que me restou? Eu me pergunto, quando foi que de um simples visitante ela virou hospede em minha casa? Penso melhor e não consigo lembrar em que momento ela veio me visitar, quem abriu a porta senão eu?  Mas quando abri esta porta?  Parece que ela sempre esteve lá. Ah! O amor, quando foi mesmo que me abandonaste?  Saíste porta a fora decidido que aqui não mais residiria, que não mais me visitaria, que não mais existiria... Mas quando exatamente isso aconteceu? Sinto como se fosse eu que o tivesse mandado embora, mas por que eu faria isso? Eu amava tanto o meu amor... Tristeza sai já daqui, pois não me pertences mais e muito menos eu a ti, mas a tristeza continua aqui, por quê? Às vezes penso que estou sozinho, mas a minha tristeza não me deixa só, faz questão de me lembrar que comigo esteve, estás e estarás. Que Companhia indesejada que eu não consigo me livrar. Oh amor por onde andarás? Que caminhos têm tomado? Que escolhas tem feito? E então eu lembro, que foi o amor que me machucou e que fui eu que o machuquei, que ele me abandonou e que eu o abandonei. Lembro que quando eu estive sozinho, foi a tristeza que me amparou, segurou-me forte e então gritou : estás morto o sentimento pelo qual zelou.